“Como sua transportadora chegará aos 100 anos?”

A primeira vez que escutei um empresário falar sobre construir uma transportadora centenária, foi há aproximadamente 10 anos, em Matelândia, uma cidade com 18 mil habitantes, que fica no oeste do Paraná.

Tratava-se do Seu Volmir Valcarenghi, fundador e presidente da Via Lácteos Transportes, uma transportadora que hoje ocupa posição de liderança na logística de leite em operações “T1” (o milk run real oficial) e também “T2”, que é a transferência entre unidades, a qual temos a honra de atender com nossa tecnologia e acompanhar e aprender com toda a transformação da empresa nesse tempo.

Quando perguntei qual seria o objetivo da Via Lácteos no longo prazo, recebi a resposta: “tornar ela uma empresa centenária”. E não ache que estamos falando de uma empresa de 90 anos e que precisa de “só mais 10” para cumprir esse objetivo.

Na ocasião dessa conversa a Via Lácteos tinha 12 anos de história. Hoje, tem 22, ou seja, faltam ainda singelos 78 anos para o Seu Valcarenghi bater sua meta e finalmente ganhar seu bônus (haha).

Logo percebi o óbvio: o que eu chamo de “longo prazo” é diferente do que o Seu Valcarenghi chama de “longo prazo”.

Fiquei me perguntando também o “porquê” de ele querer isso. Não seria melhor ter as palavras “crescimento, lucro, relevância, etc.” compondo esse objetivo de longo prazo?

Mas, como sou curioso demais, falei pra ele:

– As decisões e caminhos que você toma quando tem esse horizonte são diferentes.

– Como assim “diferentes”?

– Quando a empresa fizer 100 anos, nem eu, provavelmente nem os herdeiros, e ninguém do time atual estará na empresa. Qual a melhor decisão hoje para que isso crie estrutura e cultura para a empresa lá na frente?

E continuou:

– São decisões diferentes, pois normalmente não são as mais confortáveis ou óbvias no curto prazo.

Não sei pra você, mas essa conversa simples me gerou muitas reflexões e um baita aprendizado. Seu Valcarenghi estava falando de sustentabilidade, estava falando de ESG, mesmo sem usar essa sigla.

Observando essa história e me inspirando também em outras operações que conhecemos, elenquei aqui alguns pontos que considero muito importantes na busca da pergunta “como sua transportadora vai chegar aos 100 anos?”.

Primeiro ponto: Nenhuma transportadora quebra por falta de frete

Já ouviram isso? Aposto que sim… E aquela outra: “aquela empresa não sabe fazer conta”. Também já deve ter escutado, afinal, essas frases têm relação próxima. Não cuidar com a precificação do frete no curto prazo com certeza impacta no longo prazo. “Vou fazer esse preço pra ganhar o volume, depois brigo por um reajuste” – isso parece ser uma daquelas frases que costumamos usar para nos enganar – “vou tomar só mais uma”. Tenho oportunidade clara de ver empresas se preocupando mais que outras nesse ponto, e esse cuidado gera muitos resultados: saúde financeira, crescimento consistente e sustentabilidade.

Segundo ponto: Atenção às boas práticas

O mercado de transporte tem uma característica engraçada: nos sindicatos e eventos, todos se conhecem, são amigos, tomam uma juntos, reclamam do preço do diesel, reclamam do valor do frete, reclamam da dificuldade de achar motorista, e assim por diante, porém, quando é pra falar de boas práticas, falar sobre o que “dá certo”, aí não acontece.

Existe muito receio na realização de benchmarking entre empresas. Isso vem mudando, mas ainda tem um caminho longo para esse amadurecimento. Somada a essa característica encontro também a boa e velha “Ah, mas aqui é diferente”. Vamos falar de pagamento de frete? – “Ah, mas aqui é diferente”. Vamos falar de gestão de manutenção? – “Ah, mas aqui é diferente”. Vamos falar sobre torre de controle? – “Ah, mas aqui é diferente”.

E pra mim, que estou no dia a dia dessas empresas implementando sistemas de gestão, isso é mais frequente ainda. Eu enxergo duas certezas: os sistemas são carregados de boas práticas e as empresas por sua vez possuem suas individualidades, o problema é que muitas vezes o transportador ignora as boas práticas e acredita 100% em suas individualidades. Enfim, a falta de “olhar pra fora” e fazer benchmarking somada a posição de “mas aqui é diferente” acabam fazendo muitas empresas perderem tempo. Inverter esse jogo com certeza faz sentido para uma visão de longo prazo.

Terceiro ponto: Investimento em pessoas

Pode parecer um absurdo, mas o cenário que observo hoje nesse mercado é que transportadoras que investem em seus times possuem um diferencial competitivo claro, simples assim!

E isso acontece porque a grande maioria das transportadoras ainda ignora a importância de um time capacitado. Na maior parte (obvio que existem exceções) são profissionais mal remunerados e com baixa capacidade de análise e decisão. São profissionais destinados ao “trabalho bruto”: digitação, medição, registro etc. E quando aparece um cidadão que se destaca no meio desse cenário, já ganha espaço e relevância dentro da empresa.

Estou falando aqui de um cenário que é comumente encontrado, e como citei, empresas que perceberam a diferença que um time capacitado faz no resultado já têm um diferencial competitivo.

Mas o que é investir em pessoas? Para mim, além de treinamentos, cursos, remuneração, bônus, também considero que investir em pessoas é dar autonomia. Se você é dona(o) ou diretor(a) de uma transportadora, faça um exercício agora: quais decisões seu time tomou sem sua “canetada final” no último mês? Se for difícil responder, provavelmente você ainda é o(a) “cara” da empresa. Não tem ninguém melhor que você. E provavelmente não tem ninguém no caminho pra ser melhor que você. Sabe qual o problema disso? É curto prazo, isso é limitante.

Escutei também do Seu Valcarenghi uma frase que repito sempre que posso: “100% de autonomia, 110% de responsabilidade”. É assim que ele explica pro time dele sobre como devem atuar. Enfim, investir em pessoas “provavelmente” fará sua transportadora chegar com um folego legal aos 100 anos.

Quarto e último ponto: Tecnologia.

Essa é óbvia né? Principalmente em um texto escrito por um cara que vende tecnologia, não é mesmo? Mas a verdade é que não estou falando que o que você precisa ter é a tecnologia da KMM, estou falando que você precisa pensar em tecnologia de forma estratégica. Pensar tecnologia como assunto estratégico envolve olhar pra esse tema de forma “entranhada” no seu negócio, não como uma área isolada que presta serviços para demais áreas da empresa.

Tecnologia como assunto estratégico é pensar como você vai implementar tecnologia de forma com que seu crescimento seja sustentável, seu resultado potencializado no longo prazo e como os próximos passos da sua empresa estão dependentes de tecnologia.

Escuto muita gente falar que considera tecnologia como algo estratégico para o negócio, mas não tem nenhuma pessoa dedicada a isso na empresa. Também vejo falarem que tem tecnologia como estratégia, mas nenhum diretor da empresa está “por dentro” do que rola nos movimentos tecnológicos da transportadora. E só pra falar o óbvio: tecnologia como assunto estratégico não é um setor que cuida de help desk, é bem diferente disso. Enfim, como falei de começo, esse é o ponto mais comum, mas que precisava constar aqui. Você deve concordar comigo que pra chegar nos 100 “bem das pernas”, a tecnologia tem que estar presente na estratégia.

Existem muitas coisas para tomar conta e chegar aos “100 com corpinho de 30”, mas esses quatro pontos já ilustram bem o cenário que enxergo em grande parte das empresas do ramo.

Para finalizar, uma pergunta simples pra você: será que sua empresa chega aos 100 anos?

Texto escrito por: Leopoldo Suarez – COO na KMM | Partner nstech

Leopoldo Suarez

Leopoldo Suarez

Executive Director & Partner | nstech

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